Olá, Gente!
Deixo aqui a minha participação no desafio dos Contos ambientados no Brasil do Grupo Fábrica de Histórias.
Informações do Conto:
Título: A Promessa
Autor: Ricardo Fernandes
Número de Palavras: 1.010 Palavras
Sinopse: Camila é uma jovem brasileira inconsciente. Sai de casa sem máscara e com a avó doente cardíaca. Ao chegar, sem se aperceber, infeta a avó, matando-a.
OBS: Palavras impróprias.
Brasil. Mês de Junho. 2020. Covid 19. Quinze horas da tarde. Após o almoço. Camila sai de casa sem proteção, ou seja sem máscara. A avó estava sentada no sofá da sala, a ver um pouco de televisão. Ou melhor, a dormitar.
– Avó, eu vou sair. – Diz ela, a passar pela sala.
A avó tosse. Parece incomodada.
– Querida, não vá já.
– Tenho que ir, avó.
– Mas vai onde?
– Tenho que ir ter com uns amigos aí.
– Camila, por favor. Olha o corona.
– Que corona o quê, avó! Isso não existe.
– Olhe lá isso, as pessoas dizem que o corona pode matar. Mata as pessoas idosas, mata pessoas doentes, pessoas com asma, com problema de coração, tem que ter cuidado com essas coisas.
– Que quê, avó. A senhora não ouviu o Presidente?
A avó fez um barulho de descontentamento.
– Esse homem só fala besteira. Ele falou na frente de todo o mundo que tem histórico de atleta e que o corona nunca faria nada com ele.
– Mas é verdade, avó. O Presidente tem razão. O corona não é isso tudo não.
– Querida, o presidente está errado. Já viu os casos lá na Europa?
– Avó, até parece que a senhora não sabe que a Europa tem só lixo. As pessoas não se lavam lá, é tudo um nojo.
A avó fez mais um barulho de descontentamento.
– Camila, por favor, minha filha, isso é tudo mentira. O corona é real sim, olha só tanta gente morrendo, tanta gente perdendo família, amigos, perdendo pais, avós, tios. Isso é verdade.
– Oh, avó, a senhora está acreditando em teorias falsas. Ouça o Presidente. Ele é que tem razão.
– Se vai sair, use a máscara.
– Não vou sair de máscara, avó. O que os meus amigos vão falar?
– Vão falar que você está sendo responsável e se precavendo contra esse vírus, contra esse corona.
– Isso é um absurdo, avó. Eu vou embora.
– Não vá, Camila. Olha lá o corona.
Mas Camila já tinha ido embora de casa. A avó ficou preocupada. Ela não iria trazer o Covid para dentro de casa. Iria?
Camila caminhou pelas ruas de São Paulo. Estava ainda chateada com a conversa que teve com a avó. Não era possível que ela pensasse numa coisa daquelas. Um vírus matar pessoas. Que coisa sem noção! Isso não fazia o menor sentido.
Encontrou os amigos perto de um barzinho. Eram quatro.
– E aí? Como vão?
Eles se cumprimentaram com abraços, beijos e apertos de mão. Algumas pessoas ainda passeavam de máscara, mas eram poucas. Eles comentaram sobre isso após Camila pedir uma cerveja ao empregado.
– Vocês já viram isso? Esse povo usando máscara, tapando a boca achando que o vírus vai nos pegar?
Uma amiga riu.
– Esse povo tem fumando umas merdas meio estranhas.
– É mesmo, não é? A minha avó me veio com a história do Presidente estar mentindo. Uma loucura.
– Esse povo está louco! – Falou outro amigo.
– Está mesmo. A gente já viu por aí pessoas parecendo uns extraterrestres, coisa louca. – Comentou Camila.
– A culpa é daqueles chineses, cara. Eles sempre vêem com coisas estranhas para cima da gente. – Falou Andrielly, a mãe solteira do grupo.
– Mas o seu celular é deles. – Comentou Camila.
– Os celulares são bons, não é?! Tipo, assim... Alguma coisa é boa lá.
Os amigos riram.
– A minha tia lá do Rio pegou Covid. – Informou a mais nova do grupo.
– E aí?
– Cara, foi só uma gripezinha. – A jovem encolheu os ombros e riu.
– Está vendo? Tal como o Presidente falou. – Camila riu também.
– Essa gente está se estressando por nada.
Eles ficaram bebendo, fumando e conversando durante algumas horas. Às 19 horas, Camila regressou a casa. A avó estava dormindo com a televisão ligada. Camila chegou tentando não fazer barulho e se apressou para a cozinha para fazer o jantar. Fez uma sopa de canja de galinha. A avó acordou entretanto e pôs a mesa para as duas. Camila preparou as tigelas e colocou duas colheres de sopa para a avó e duas para ela mesma. Sentaram-se, caladas. Camila olhava para a televisão, despreocupada. A avó olhava séria para a neta.
– Como foi a tarde?
– Foi boa.
– Os seus amigos levavam máscara?
– Não, avó. Claro que não.
– Eles não tinham máscara? – A avó parecia triste.
– Não, avó. Isso é tudo uma mentira.
A avó decidiu ficar calada e comeu a sopa em silêncio. Camila nem olhou novamente para avó e voltou a sua atenção para a televisão.
Uma semana depois a avó foi para o hospital. Tinha sintomas de tosse, febre, falta de ar e dores no peito. O teste à Covid 19 pôde confirmar a razão. Positivo. A avó apenas resistiu mais uns dias. O coração parou. Camila chorou à porta do hospital e nem pôde ir ao funeral da avó.
Dias depois, Camila foi falar com os amigos no mesmo barzinho. Apenas três amigos estavam presentes.
– O que aconteceu com a Bia? – Beatriz era a mais nova do grupo. Andrielly, era a mãe solteira, tinha ainda Bruno e Isadora, além de Camila.
– Ela está em casa. A tia morreu com o corona. – Respondeu Andrielly, séria.
Camila começou a chorar.
– Gente... Eu falei para a minha avó que o corona não era nada. Nem pude me despedir direito.
Os amigos abraçaram Camila.
– Se vocês quiserem, a minha mãe está criando umas máscaras em casa. – Comentou Bruno.
Camila foi a primeira a afirmar com a cabeça.
– Eu compro. Quando o Covid terminar eu irei ver a minha avó.
Até ao fim deste conto, Camila ainda não pôde visitar a avó. O surto de Covid 19 ainda não tinha terminado no Brasil, na verdade, nem no Brasil e nem no Mundo. No entanto, os hábitos de Camila se alteraram. Ela passou a usar máscara quando saía na rua, começou a cumprimentar os amigos com o cotovelo e ainda tenta manter a promessa que fez à avó. Irá ao cemitério ver ela quando tudo isto terminar. A Camila pode não ter ajudado a avó, pode não ter acreditado nela, mas agora ela sabia: O Covid 19 não era apenas uma gripezinha.
Gostaria muito que essa história fosse pura ficção, mas a mesma mais parece um relato real de algo que está acontecendo aqui no Brasil. Muitos não só creem que que o corona é uma gripezinha, como acham que é tudo uma história criada pela mídia para prejudicar o governo de Bolsonaro.
ResponderEliminarBom, ainda assim, gostei da história, parabéns.